31 agosto 2008

Brasileirando a alma (11) (continua)

1. Passam seis viaturas da campanha de um candidato a prefeito de São Paulo, bandeiras, música dançante, dísticos enaltecendo as virtudes do candidato. Montes de pessoas vão subindo e descendo os passeios ou atravessando as faixas de pedestres, o movimento de carros é intenso. Procuro verificar se alguém pára, se alguém se interessa. Não vejo ninguém parar para o efeito, não lobrigo olhos ansiosos, a vida prossegue, aqui, neste micro-cosmos da imensa São Paulo onde estou. E dou por mim a defender a perversa hipótese de que a multidão está convertida, aqui e agora, no indivíduo domingueiro, despolitizado, privado e consumista buscando as últimas novidades e os últimos hedonismos do fim da semana.
2. Dois brasileiros disseram-me, atónitos, que não sabiam que havia linchamentos no Brasil, que tinham sabido disso pelo meu blogue, que a imprensa local não fazia cobertura do fenómeno.
3. Os mesmos dois brasileiros disseram-me que uma parte significativa da população de São Paulo é nordestina. Em três locais diferentes, um deles fez-me notar a fala nordestina de três brasileiras em empregos de baixa renda.

Culinária de África

O blogue que aqui sugiro está em francês e, infelizmente ainda, não tem nenhuma referência a Moçambique. Se quer ler em português, sugiro este tradutor. Bon appétit!

Empresários e negócios em Moçambique

Quer saber um pouco dos empresários e dos negócios em Moçambique? E de quem neles aparece em destaque? E de algumas coisas mais? Pois leia aqui os cabeçalhos do Africa Intelligence.
Se quer ler em português, use este tradutor.

Brasileirando a alma (10) (continua)

Uma terrível banalidade: cada homem nasce do ventre de uma mulher. Uma banalidade banal: mas são homens quem, por regra, transforma as mulheres em mercadorias sexuais. Penso nisto enquanto observo, de um quinto andar, o intenso movimento no exterior de um prostíbulo, aqui, em São Paulo. De um lado para outro circulam mulheres e nada nos seus semblantes parece denotar surpresa ou desencanto. Aqui está um aparente problema: não é a mercadorização da sexualidade feminina que está em causa, mas a sua aceitação por parte das próprias mulheres, a sedimentação dos mecanismos de dominação. Meio bem mais pequeno, o de Maputo: mas a realidade não é distinta.

BOBs2008 começou hoje

Começou hoje, Dia Mundial dos Blogs, o BOBs2008. Confira aqui. O ano passado, o Diário de um sociólogo foi um dos dez weblogs seleccionados pelo júri para o melhor weblog em língua portuguesa e terceiro na classificação público. Deixe-me pedir-lhe que vote neste blogue, caso ache que ele tem algum valor. Obrigado.

30 agosto 2008

Faleceu David Aloni

Faleceu hoje em Maputo o Dr. David Aloni Selemani, meu amigo e meu conterrâneo. Os meus pêsames à família enlutada. Paz à sua alma.
Nota: Obrigado à Ivone Soares por me ter feito chegar a infausta notícia.

amote

É a canção do vídeo dedicada a Yolanda? Nenhum mal, faz de conta de que o meu poema tem o teu nome...


I
sim amor o amor minha querida
é este amor que gera esta paixão
que parece fogo na alma e na carne
isto de te urgentar a cada momento
esta coisa densa forte íntima infinita
este fósforo que é tão tão tão grande
que vê tu acende mesmo sem acender
carvão em brasa mesmo adormecido
II
mas ouve este amor é também conflito
amor desamor são dois irmãos gémeos
são serão duas coisas numa mesma coisa
tu sabes meu amor que o meu desamor
forte agressivo cruel sem razão para ti
é também a minha declaração de amor?
quem te disse meu amor que as coisas
são assim uma num lado outra no outro?
III
olha o meu amor tem dois corações
amor o amor é sempre isso mesmo
uma coisa duas coisas sempre uma
não há nunca coisas homogéneas
apenas há coisas sempre diferentes
mesmo tu meu amor és diferente de ti
tantas vezes vê lá tu sem disso saberes
no teu aparente eu único uma peça só
IV
sabes amor este dual amor é afinal
a inesgotada fiel tensa busca de ti
a mesma lanterna apontada para ti
a mesma bússola dando o teu norte
e se queres saber tudo afinal agora
sabe que te amo e amarei três vezes
quando te amo te desamo e te reamo
sendo-te a diagonal de dois em mim

Magnas bases

Já sabemos que Eneas Comiche (Frelimo) em Maputo e Deviz Simango (Renamo) na Beira foram reprovados pelas bases para as eleições autárquicas de Novembro, sendo substituídos respectivamente por David Simango e Manuel Pereira. Como é que sabemos isso? Sabemos através dos arautos da verdade partidária. Claro, é segredo de polichinelo. Também sabemos que gente vária se tem interrogado sobre os méritos e sobre os deméritos das decisões que, vindas das bases, são, porém, tomadas pelos topos. Em última análise, nenhum de nós, profanos, conhecerá os segredos das caixas de pandora. Quem forma as bases? Quantos reais membros têem as bases? A que grupos sociais pertencem? Que grupos de pressão actuaram? Quem no topo avalizou ou alterou as posições das bases?
Seja qual for o destino da verdade, creio que toda a enorme discussão travada em torno de Eneas Comiche e de Deviz Simango tem a ver com algo que, afinal, é ainda importante para muita gente: a moral, o respeito pelo que se fez e que se poderia continuar a fazer. Mais: pode acontecer que Simango ganhe em Maputo com alguma vantagem, mas pode acontecer que Pereira perca na Beira. Estou certo de que os leitores dirão: está enganado, Carlos Serra!

Brasileirando a alma (9) (continua)

Atravessar passadeiras (aqui diz-se faixas de pedestres) é um risco nesta enorme São Paulo motorizada. Sem dúvida de que todos nós, peões, amamos subverter regras e atravessar ruas quando não devemos e por onde não devemos. Mas também há outros fenómenos. Nas muitas vezes que atravesso ou quero atravessar as faixas, reparo que muitos peões têem medo e passam correndo mesmo com o verde do seu lado. Et pour cause: é que muitos motoristas paulistas não mostram intenções de respeitar quem não tem pneus, quem só tem suas pernas. E mais grave é quando a gente está atravessando e um motorista curva para o nosso lado vindo de uma perpendicular. Ou você passa a correr ou você se arrisca a ser pisado. Ontem ia-me acontecendo isso. Zangado, aproximei-me de uma senhora mais zangada ainda do que eu, loira e arrogante, e disse-lhe: "Senhora, nós inventamos as máquinas, depois elas nos dominam!" Mais tenebrosamente irada ficou a senhora com meu desplante, por isso furiosou totalmente sua viatura e me ia mesmo atropelando em sua partida trovoadesca.

Mugabe no Parlamento


Aconteceu assim no Zimbabwe: como habitualmente, Robert Mugabe chegou ao Parlamento de Rolls Royce e depois entrou com toda a pompa cerimonial, seguido de perto pelos seus generais. Certamente continua convencido de que a história não mudou. Siga aqui e aqui o que se passou. Se quer ler em português, utilize este tradutor. Obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, pelo envio das referências.

29 agosto 2008

Verticalidade de Comiche torna-o matéria para a frigideira

Com o título em epígrafe, eis o editorial do semanário 'Savana" desta semana:
Algumas das virtudes que qualquer partido no poder deve ter são a sua capacidade de ser previsível, de medir aquilo que é o pensamento generalizado dos eleitores e, não tão menos importante, projectar ao público uma imagem de seriedade e fiabilidade.
São atributos que o partido Frelimo não pode reivindicar possuir, se as últimas eleições internas para o município de Maputo são elementos suficientes que nos permitem fazer qualquer juízo.
É extremamente difícil (se não mesmo impossível) a qualquer ser humano racional imaginar que um partido que concorre a eleições que pretende ganhar pode-se sujeitar ao risco de ter que dispensar como seu candidato uma pessoa que já deu provas de competência, seriedade, respeitabilidade e incorruptibilidade para o substituir por alguém que é, na essência, uma quantidade desconhecida.
Que a Frelimo o tenha feito, ao substituir como candidato à presidência do município de Maputo Eneas Comiche por David Simango, mostra com toda a clareza o seu sentido de arrogância extrema e de total desprezo pelos desejos dos habitantes desta cidade. A Frelimo nem sequer se deu ao trabalho de fazer uma breve sondagem para saber como reagiriam os residentes da cidade perante esta inexplicável mudança, o que lhe permitiria medir as suas potencialidades nas urnas.
A Frelimo poderá argumentar que não havia necessidade de medir a tendência do eleitorado municipal, tratando-se de uma eleição interna, dentro do partido. Mas esse argumento descura o facto de que quem elege o presidente dos municípios não são as oito dezenas de militantes da Frelimo intoxicados pelo seu ódio em relação ao actual presidente. Quem elege o presidente do município é a grande massa de residentes desta cidade, alguns dos quais nem sequer são membros da Frelimo, mas que reconhecem e respeitam o trabalho realizado na capital nacional durante os últimos cinco anos.
Sem opções, e profundamente desiludidos com o cinismo dos políticos, a grande maioria destes eleitores terá melhores coisas para fazer no dia do voto do que ir legitimar aquilo que será, de facto, uma autêntica palhaçada a passar por eleições.
Nenhum ser humano é perfeito. E certamente que Comiche deve ter os seus próprios defeitos. Um desses defeitos pode ser a sua seriedade e apurado sentido de serviço público que não lhe permitem distribuir sorrisos cínicos quando as coisas não estão a correr bem. Ciente das suas responsabilidades ao serviço do povo, Comiche soube separar os recursos públicos do partido ao qual ele pertence. Não permitiu que dinheiro resultante das contribuições dos munícipes, parte do qual através da Taxa de Lixo, fosse utilizado de forma profilática para sustentar a imensa bateria de primeiros secretários do seu próprio partido.
A cínica referência às “bases”, como tendo sido elas quem decidiu pelo afastamento de Comiche devido à sua má articulação com elas é, na verdade, uma espécie de eufemismo para ocultar os poderosos interesses financeiros para quem Comiche era um empecilho para o prosseguimento dos seus projectos na cidade.
As chamadas “bases” na verdade não existem, dentro do contexto em que elas nos são apresentadas e as suas “ideias” articuladas. As “bases” existem apenas no seu formato como um voto comprado e manipulado para se atingir outros objectivos longe do alcance dessas mesmas “bases”. Estamos a assistir, de facto, a um fenómeno em que os criminosos começam a ganhar apetência em se apoderarem do edifício político, antes de se consumar a captura do Estado. Se este não é o caso, que “bases” são essas que representam uma candidata cujo único voto que consegue nas urnas é o seu próprio voto?
Se outro nome não existe para melhor caracterizar o que aconteceu no município de Maputo nas eleições internas da Frelimo na Sexta-Feira passada, para nós (e acreditamos que estamos a representar o sentimento da vasta maioria dos residentes da cidade) foi simplesmente um escândalo com cujas consequências teremos que co-habitar durante os próximos cinco anos.
Acaba de se provar que em Moçambique se alguém não é politicamente promíscuo, populista e corrupto acaba sendo matéria para a frigideira.
Mas a maior lição que se deve tirar de toda esta aventura é a importância, agora mais comprovada do que nunca, de uma oposição forte e credível, em quem o eleitorado pode optar como alternativa.

Brasileirando a alma (8) (continua)

Sempre que posso, torno-me arqueólogo das ruas de São Paulo, escavo por todo o lado, procuro coisas fixas, identidades perenes, algo sólido por baixo desta imensa volatilidade, desta contagiosa efemeridade do cruz-cruza-desaparece de todos nós. Em cima fica todo este cimento, este concreto; no meio a fugacidade dos encontros, dos cruzamentos. E em baixo há o quê? Pergunta viciada. Em baixo não há nada. A raiz das coisas está no que chamei meio. O fixo está no fugaz, na silhueta, no foi-se, no desconhecido. Toca o alarme da mota estacionada e sem proprietário à vista: "este veículo está sendo roubado...." Mas ninguém está a roubar a mota. Aproximo-me. Diz-me o colega brasileiro para eu não fazer isso, aqui ninguém liga a ninguém, cada um por si, perigo mora em todo o lado. Atravesso a rua: uma oficina de bem-estar, lá dentro montes de pessoas exercitam-se, musculatura, corrida artificial, rostos suados, olhares ansiosos. A cultura do bem-estar da moda feita a correr, sempre a correr. Mais à frente passo por um alfaiate clássico, dá prazer, a calça faz-se, não se compra feita, não é como sopa de pacote. Depois uma oficina de cães: entra cão sujo, sai neo-cão com cheiro a colónia. Orelhões. Amo orelhões. Sempre os estudo, nem sempre estão operacionais, nem sempre podemos telefonar. Em Paris, os orelhões são habitados por pequenos anúncios de aluguer de apartamentos, de fotocópias, de tratamento de teses. Aqui, são habitados por anúncios de mulheres prometendo o céu sexual aos fregueses. Passa uma rapariga de bumbum avantajado e seios prepositadamente deixados à mostra por um sutien-biquini. Julgo ter contado cinco homens que se viraram para trás com os olhos ancorados nesse bumbum. Mas olhada rápida com passada-corrida logo reposta. Uma loja de coisas antigas, de tudo um pouco. Uma loja de chapéus, de paletós, de casacos, tudo de bom gosto, o proprietário à porta, imponente e vigoroso em seu tempo readquirido. Vozes, identidades lutando contra a inexorável megapólis do cimento-concreto, espasmos doridos esmagados pelos supermercados, pelas coisas já digeridas. E lá vou, cruzando-me com toda esta gente misteriosa, igual, efémera. Estranha sensação de sermos nada estando juntos sem estarmos.

A "hora do fecho" do "Savana"

Na última página do semanário "Savana" existe sempre uma coluna de saudável ironia que se chama "A hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Deliciem-se com a "A hora do fecho" desta semana:
* Finalmente o banco dos bancos parece ter posto de lado o papo dos altos custos dos bancos comerciais e quer passar à prática para o povão ter a vida mais facilitada. Uma das medidas que está em curso é tentar uniformizar um serviço nacional de ATM (operações automatizadas) em que os utentes de todos os bancos podem ir a uma mesma caixa disponível e as casas comerciais poderem fazer débitos a partir de uma única maquineta no balcão. Ganham os utentes, o comércio e os bancos mais pequeninos ...
* Os ventríloquos da maçaroca tiveram grandes dificuldades em explicar a exclusão de Comiche por 53 camaradas seus. Quer na espectaculosa, quer na estatal, os moços de serviço sofrerem um verdadeiro KO.
* As “primárias” da Frelimo também causaram outras quedas. Os edis dos municípios críticos, como Chimoio e Pemba também foram afastados. O homem do Chimoio bem tentou resistir dizendo que tinha o apoio das bases. Na cidade do turismo há um aduaneiro que quer disputar o martelo. Dos finados diz-se que já tinham o destino marcado.
* Como o destino também estava traçado para o antigo “boss” da organização dos empresários. O homem não teve mesmo chance na vila que faz fronteira com a Suazilândia.
* Como acontece habitualmente nestes casos, circulam grandes teorias conspirativas para explicar a queda de Comiche. Uma delas desenterra o famigerado caso BCM e o seu irmão que foi ali administrador. Nas próximas semanas vão certamente surgir mais teorias. SMS que foram apelidados de “subversivos” pelo “lambebotismo” apelam a manifestação de apoio para o actual timoneiro da Praça da Independência.
* Na Beira também continuam as conspirações para tentarem desalojar a todo o custo mano Deviz. Na última iniciativa, tentaram aliciar o homem do Acordo de Roma para dividir etnicamente o eleitoral e abrir alas ao patrão local ... da maçaroca.
* Não houve conspiração mas há um verdadeiro dilúvio em Cabo Delgado depois da passagem por lá do Tsunami 2. Dizem que parecia que se tinha voltado aos tempos dos grupos dinamizadores. Os fiscais que foram despachados para Pemba andam numa roda vida a passar multas a torto e a direito, ameaças de prisão e até de expulsão para desrespeito às normas laborais. Funciona politicamente para as massas mas é um mau sinal para os investidores ...
* A morte do inditoso primeiro timoneiro da nação continua a alimentar paixões e tomadas de posição. Mamã Graça, habitualmente contida, deu um bofetão no coronel do grande rio. Agora um piloto de linha deitou mais umas achas na fogueira. Os “tovarich” que tripulavam o TU-134A não tinham os papéis apropriados. Vamos ver a próxima dica ...
* Mano Guebas apanhou mais uns cabelos brancos pelas terras dos manhambanes. O pessoal que se abotoou com os “sete bis” ainda só deu de volta 5%. Se a mola fosse bancária era falência pela certa ...
* Com HCB à distância da palma de uma mão, há constantes apagões nas terras quentes dos nyungués praticamente sempre à mesma hora. Cahora Bassa é mesmo nossa.
* “Este (último) Governo que eu tive foi o pior na história…” Robert Mugabe, falando terça-feira num almoço por ocasião da tomada de posse do novo parlamento do Zimbabwe. Comentários para quê?
Em voz baixa
* Com tantos elogios a Comiche pelos seus camaradas, aceitam-se propostas para novas tarefas a partir de Dezembro, depois de entregar as pastas do município ...

Frelimização

Lia há momentos o semanário "Savana", recebido esta manhã via email. Tenho lido o "Notícias". A derrota de Eneas Comiche ante David Simango nas eleições internas da Frelimo destinadas a apurar o candidato do partido às eleições autárquicas, continua a ser um tema de apaixonado e apaixonante debate. O vencido transformou-se no cavalo de batalha de uma frente moral.
Porém, aqui à distância, em São Paulo, apercebo-me de uma coisa interessante: é que, certamente sem premeditação, a Frelimo conseguiu e consegue fazer de si o discurso obrigatório, a matriz reflexiva dos pró-Comiche e dos pró-Simango. Na verdade, todas as nossas posições têem sido construídas no interior de um só quadro de referência, de um só partido. Não há discurso fora da Frelimo: é dentro dela que se está.
Vamos a ver se a mesma paixão irá ser colocada na derrota de Deviz Simango nas eleições internas da Renamo na Beira e na sua substituição por Manuel Pereira.

Entrevista com Maria Ignez Kato


Aqui publicarei brevemente uma entrevista com a defensora pública brasileira Maria Ignez Baldez Kato, já referida neste diário. Peço a especial atenção antecipada dos operadores jurídicos moçambicanos.

Ciências criminais (4) (os excluídos são descartáveis)

Retomo um ponto deixado no último número.
O que concluiu Maria Ignez Baldez Kato? Concluiu que nenhuma sociedade será melhor se apenas nos limitarmos a defender a igualdade formal dos cidadãos perante a lei. O defensor público deve aprofundar o seu dever constitucional trabalhando no sentido de os excluídos sociais lutarem para, também eles, disporem dos recursos materiais que os tornem efectiva e genuinamente iguais aos outros perante a lei e numa democracia de facto.
E, já agora, permitam-me inserir aqui um extracto do que, na sessão inaugural do seminário do IBCCRIM, afirmou o Doutor Alberto Silva Franco:
"Todos nós sabemos que vivemos tempos difíceis, extremamente difíceis, no Brasil e no mundo. Para onde quer que se volte o olhar, tudo parece estar de pernas para o ar. A renda continua concentrada, numa proporção assustadora, nas mãos de poucos; o fosso, em termos de desigualdade humana, se alarga e se aprofunda mais e mais; os fluxos migratórios, resultantes do aumento da pobreza e da falta de oportunidades, gerados pelo modelo econômico globalizador, transformam-se em tráfico de seres humanos, ou seja, na terceira atividade ilícita mais lucrativa depois do tráfico de drogas e de armas, fazendo lembrar os tempos da escravidão dos séculos XVII e XVIII; muros são construídos e forças armadas são posicionadas nas fronteiras dos países mais ricos, para impedir a invasão dos miseráveis que lutam pela sobrevivência física; as cidades se agigantam num ritmo avassalador e os campos se esvaziam; as favelas espraiam-se sem nenhuma limitação pelas áreas urbanas e invadem todos os espaços possíveis e os habitantes dessas cidades da miséria estão permanentemente privados do trabalho, da possibilidade de estudar, do atendimento à saúde, do acesso à justiça e à segurança, pessoal e coletiva; os excluídos são descartáveis numa sociedade de consumidores porque não são necessários na medida em que são consumidores falhos, incompletos, imperfeitos; os meios de comunicação social, a serviço de grandes grupos econômicos, manipulam a opinião pública e são os grandes produtores da legislação penal emergencial; a corrupção desavergonhada se esparrama pelo espaço público; os valores éticos e morais ingressam num processo de liqüefação; a insensibilidade toma conta de tudo e de todos; a política, com suas alternativas, e o discurso jurídico, com as suas variações, distanciam-se da realidade viva e começam a ser incluídos no rol das atividades secundárias, porque são postos num segundo plano pelo pensamento único que dá validade exclusiva às leis do mercado."
Nota: foto reproduzida daqui.

28 agosto 2008

Vai Mugabe formar novo governo esquecendo negociações para partilha do poder?

Citando um ministro do Zimbabwe, escreve o Mail&GuardianOnline que Robert Mugabe irá desafiar a oposição e formar um novo governo apesar das negociações tendentes a uma partilha de poder. Confira aqui. Se quer ler em português, use este tradutor.
Adenda: já agora, leia um artigo de opinião de Francis Fukuyama com o título "É esta a era dos autocratas?", que coloca várias questões para debate a propósito de personagens como Pervez Musharraf, Hogo Chavez e Robert Mugabe. Obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, pelo envio das duas referências.

Como foi planeada e executada a violência pós-eleitoral no Quénia


Um relatório permite agora saber como membros do governo e líderes religiosos planearam e promoveram a dramática violência pós-eleitoral no Quénia. Confira aqui. Se quer ler em português, use este tradutor. Obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, pelo envio da referência.
Observação: vamos a ver se e quando surge um relatório similar no tocante ao Zimbabwe.

Nova carta pastoral com a sombra Quénia/Zimbabwe


Os bispos católicos produziram uma nova carta pastoral, que podemos ler de muitas maneiras. Tenho por hipótese que a violência política nas eleições do Quénia e do Zimbabwe constituem o pano de fundo do texto e o sentido dos apelos e das advertências . Confira aqui.

Ao largo

Um homem nada

em mar aberto
linha reta traçada
sempre em frente
como se houvesse meta
em seu percurso
ou porto adiante
ou terra.
E adiante
é mar somente
e mar às costas
sem ponto de chegada
que se veja
e sem medida outra
que não seja
a braçada.
N.B.- Marina Colasanti, Fino sangue. Rio de Janeiro/São Paulo: Editora Record, 2005, p. 21.

27 agosto 2008

Brasileirando a alma (7) (continua)

Pois é, lá estou eu aqui, ao mesmo tempo em dois sítios, acordado pela hora de Maputo (7:26), sem conseguir dormir pela hora de São Paulo (2:26), aqui nesta múltipla São Paulo onde a madrugada reina. Um intenso tráfego ocupa a rua onde estou. E, como sempre, interrogo-me sobre os destinos de toda esta gente que vejo, sentado nas escadas dos olhos, café na mão, cachimbo na boca, olhos culimando a noite. Lá passam dois catadores, lá estão os táxis pega gente larga gente, lá estão as trabalhadoras do sexo (continuo a surpreender-me com a imensa juventude delas, em suas curtas saias, em seu futuro ansioso), lá está aquele pequeno povo engravatado gestor dos corpos e dos prazeres femininos, lá passam os carros da polícia, um pouco mais à frente, numa esquina, estão quatro carros policiais, dois têem as luzes de aviso, polícias falam-se, certamente houve ali algum problema, dois jovens dormem junto a uma recipiente de lixo embrulhados em mantas que já não são mantas. E lá passa uma ambulância, sempre há uma ambulância de noite, em seu misterioso destino pisca-pisca, mas desta vez sem sirene accionada. Aqui está gente que faz dia da noite e aqui está gente que tenta noitar artificialmente de dia, bronzeando-se em estabelecimentos especializados. Que tem isto de especial? Absolutamente nada. Mas justamente porque amo o banal, aqui o descrevo, nesta São Paulo deste imenso Brasil de tão grandes contrastes sociais.

Ciências criminais (3) (acesso formal à justiça significa acesso material à justiça?)

Prossigo esta série.
No período da manhã de ontem, estive num painel cheio de participantes no qual, entre outros, interveio Maria Ignez Baldez Kato, mestre em Ciências Criminais, professora de Processo Penal e defensora pública (sobre defensoria pública no Brasil confira aqui) do Estado do Rio de Janeiro. O tema era este: Defensoria pública: a Justiça onde o povo está.
Numa sociedade dividida em classes sociais, em conflitos, mapeada pela exclusão social, que papel deve jogar o defensor público? Deve ser o de se limitar a cumprir com o seu dever constitucional, técnico, ou deve ele ir para além disso, ligar-se, por exemplo, aos movimentos sociais, compreender que a igualdade formal perante a lei não significa igualdade de oportunidades de acesso a essa lei? Acesso formal à justiça significa acesso material à justiça?
Prossiguerei mais tarde. Mas desde já me permito dizer que foi a primeira vez na minha vida em que estive e estou presente numa discussão não sobre o direito enquanto tal, enquanto coisa técnica, coisa neutra, mas enquanto instrumento político imediato (isso mesmo, político, assim o disse Maria Ignez).

26 agosto 2008

Ciências criminais (2) (não é menos real a sociedade de que carecemos)

Começou hoje aqui em São Paulo o 14.° seminário internacional organizado pelo Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, com 1.000 participantes, a maior parte brasileiros, mas também juristas e cientistas sociais de países europeus e sul-americanos. Dos países africanos, apenas estava eu, infelizmente. O presidente da directoria executiva, Doutor Alberto Silva Franco, fez uma breve introdução. Em síntese, referiu-se ao papel dos operadores jurídicos numa sociedade marcada pelas desigualdades sociais, pelos excluídos, pelas cidades de miséria (sic). Sumarizo uma parte do que ele disse: se é real a sociedade em que vivemos, não é menos real a sociedade de que carecemos. Temos de ousar a utopia, temos de acreditar que a realidade não é destino, temos de acreditar que as coisas se modificam no preciso momento em que julgamos que não, temos de saber usar o pensamento crítico e perturbador (sic), ainda que seja apenas um só a protestar contra as injustiças sociais (conto poder apresentar aqui, quando e se possível, o texto integral do autor).
Prosseguirei.

Tentativa de assassinato de Barack Obama?

A internet está cheia de despachos sobre uma possível tentativa de assassinato de Barack Obama. Confira, por exemplo, aqui. Se quer ler em português, faça uso deste tradutor. Obrigado ao leitor que me alertou para a notícia.

Michelle Obama

Ciências criminais (1)

A violência social, em suas múltiplas formas, é cada vez mais central no meu trabalho científico. Mas, também e sempre, as fracturas sociais, a luta pela dignidade humana. Essas as razões por que participo no 14. ° seminário internacional do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, aqui, em São Paulo. Logo que puder falarei disso, aguardem. Abraço.

25 agosto 2008

Lovemore Moyo do MDC: novo presidente do parlamento zimbabweano

Pela primeira vez na história do Zimbabwe desde a independência nacional em 1980, o parlamento tem um novo presidente que não pertence à ZANU-PF de Robert Mugabe: chama-se Movemore Moyo, é da ala MDC dirigida por Morgan Tsanvirai, tem 43 anos e é um herói da luta de libertação. Confira aqui esse e outros desenvolvimentos políticos do Zimbabwe. Se quer ler em português, faça-o aqui.

Brasileirando a alma (6) (continua)

Em Outubro realizam-se eleições para prefeitos no Brasil. Há momentos vi e estudei na televisão uma série de programas eleitorais de candidatos. Programas curtos, extremamente bem feitos, cada candidato aparece com o seu produto, quase sempre o mesmo produto apenas com pequenas variações linguísticas, palavras que sugerem a certeza consolidada, laivos de algum milenarismo aqui e acolá. Habitação, saúde e escolas: um triângulo discurso quase permanente. Várias candidatas, coisa interessante. Fixei um, o de uma candidata do Partido da Causa Operária para a cidade de São Paulo, com o lema "Governo operário e socialismo". Os capitalistas impedem a justiça e a dignidade dos brasileiros. Bem, afinal ainda existe este tipo de discurso e de aposta social.

Dois linchados na Matola (38ª e 39ª vítimas de linchamento este ano a nível nacional)

De acordo com a TVM, dois irmãos gémeos de 18 anos foram queimados vivos na noite de sábado por uma multidão na Matola A, quarteirão 44, Maputo. Segundo a Polícia, os malogrados foram acusados de terem violado uma menor de dezesseis anos há cinco dias. Mas a família das vítimas alega ter havido um equívoco e que os dois gémeos eram sucateiros que estudavam à noite. Confira aqui.
Com estas duas novas vítimas, eleva-se para 39 o número de linchados este ano no país em zona urbana e péri-urbana, nos casos publicamente reportados - leia a minha última postagem aqui -, a saber: doze em Chimoio, onze na Beira, dez em Maputo, dois no Dondo, um em Vandúzi, um em Quelimane e agora dois na Matola.
Desta estatística, não constam os casos dos linchamentos por acusação de feitiçaria, área cuja pesquisa estou a dirigir.

Brasileirando a alma (5) (continua)

A esta hora, 8:47 de Maputo, 3:47 de São Paulo, se faz noite ainda, faz sempre dia na alma da muita gente que bula-bula seus passos para trás e para diante toda a noite-dia, monitorando seus misteriosos destinos. Cruzo com catadores, sondo o ar cansado das trabalhadoras do sexo, sou as luzes dos muitos táxis. Sinto-me um pouco como o Émile Zola estudando as ruas de Paris (fiz esta fotografia num pequeno papel há cerca de duas horas e passei-a para aqui agora).

Dois linchados na Matola?

Acabo de ler um comentário do leitor Zefanias dizendo que duas pessoas foram linchadas na Matola, zona das mangueiras (entre Bic e Shoprite).
Estou em São Paulo e, portanto, distante das minhas fontes de informação. E sem roaming no celular. A versão online do "Notícias"de hoje nada refere. Alguém me pode ajudar? Quando se deram os casos (período do dia, hora provável)? Quem foram os linchados? De que sexo são? Idade? Motivo dos linchamentos? Obrigado pela ajuda.

No Brasil

Só para vos dizer que já estou neste Brasil que amo. Mas o problema é que estou com a alma horária de Maputo e aqui são menos 5 horas.

23 agosto 2008

Até amanhã no Brasil

Amanhã escrevo-vos já no Brasil. Este diário será actualizado normalmente. Até amanhã, então!

MISA e liberdade de imprensa

De acordo com o semanário "Savana" desta semana, presidentes dos núcleos provinciais do MISA queixam-se de que se agravam as violações da liberdade de imprensa em Moçambique. Confira o texto aqui.

Obama escolheu Biden para vice


O senador Joseph Biden (à direita na foto) é o vice-presidente escolhido pelo candidato democrata às eleições presidenciais norte-americanas, Barack Obama. Confira aqui. Sobre Biden, leia aqui. Se quer ler em português, use este tradutor (obrigado ao leitor J. Macharty por me ter avisado).

Do poder político (9) (continua)

Vamos lá prosseguir um pouco mais esta série.
Escrevi no último número que o capitalismo produz as infra-estruturas de um múltiplo processo de entorpecimento aproveitado pelas elites políticas e pelos seus intelectuais orgânicos. Considerarei, de forma breve, três formas culturais de anestesia política:
1. Cultura da informação
2. Cultura do kitsch
3. Cultura do espectáculo
A cultura da informação é um dos mais interessantes exemplos de despolitização em curso no capitalismo deste século.
O eixo vital dessa cultura tem a ver com factos (contra factos não há argumentos, não é?), com técnica, com informação em bruto, com um processo de fornecimento massivo de coisas neutras e neutralizadas em permanência pelos mais mais variados canais de formação pela informação assexuada.
O conhecimento surge como um processo alimentar básico e imediato: servimos refeições de coisas, prontas a digerir, sem crítica, simples, compreensíveis, sem ideologia, sem as agruras do que faz pensar (e se parecemos estar a fazer pensar, é no sentido neutral, inócuo, de fazermos não pensar uma vez mais, pelo doce jogo dos sofismas), sem o risco do que faz colocar questões políticas de fundo; de coisas que tornam natural tudo o que fazemos e nos fazem fazer, de coisas que procuram evacuar os mecanismos produtores de relações sociais, de coisas (e quantas são, cada vez mais!) que nos levam a eliminar a consciência das desigualdades sociais, da injustiça social. O celular é o mais brilhante produto da informação coisal e socialmente neutra.
A expressão tecnologias de informação, que tanto amamos empregar no nosso país, é o mais eficiente resumo de um mundo que se pretende asseptizado, docilizado, inofensivo, anestesiado pelos enzimas do equilíbrio social, de um mundo que é distribuído em massa pela indústria das coisas e rentabilizado diariamente pelos intelectuais dos factos e das relações sociais tornadas naturais, imutáveis, de um mundo que faz casar, por exemplo, um computador, a internet e a informação.
Este é, afinal, um mundo no qual e para o qual os gestores e os intelectuais da descerebralização procuram a todo o transe mostrar que não há contradições sociais, que não há mais nem direita nem esquerda, que desapareceram as clivagens sociais, que a verdade depende dos óculos que usamos, que tudo é um mero ponto de vista, que a ciência tem de ser neutra, bem comportada. E se problemas há, só podem ser obra de disfunções, de défices afectivos, de ressentimentos psicologica e medicamente tratáveis, de empenhamentos sociais vãos, de mãos invisíveis, de arruaceiros. A cultura da menoridade intelectual tornou-se regra.

22 agosto 2008

Hoje: Obama deve anunciar vice por sms

Está previsto que hoje o candidato democrata às presidenciais norte-americanas, Barack Obama, anuncie por sms para dois milhões de pessoas quem será o seu vice-presidente. O candidato já afirmou que o escolhido será uma pessoa independente.
Nota: bem, eu também deverei receber o sms...

David Simango: candidato da Frelimo em Maputo

Acabo de ser informado por fonte digna de crédito de que o ministro da Juventude e Desportos, David Simango, será o representante da Frelimo nas eleições autárquicas de 19 de Novembro para a cidade de Maputo. Assim, perderam Eneas Comiche, actual edil - que concorria para a reeleição - e Generosa Cossa, chefe da bancada da Frelimo na Assembleia Municipal.

Publicidade política

O noticiário da Rádio Moçambique (RM) das 19:30 de hoje teve uma grande presença das eleições internas no partido Frelimo para candidatos às eleições autárquicas de 19 de Novembro. Nenhum outro partido figurou no noticiário. Os resultados da eleição na cidade de Maputo devem ser anunciados às 20:15, segundo o último despacho do jornalista da RM no local, Centro de Conferências das Telecomunicações de Moçambique.

Custódio Duma

O jurista Custódio Duma, da Liga dos Direitos Humanos, escreveu um texto com o título "É preciso coragem para não aceitar!" Confira aqui.

E agora também os trabalhadores do sexo

Conta o jornalista Victor Machirica que no Chimoio, perante a vida difícil, agora não são apenas as trabalhadoras do sexo que disputam o mercado: são, também, os trabalhadores, "vigorosos jovens", jovens desempregados ou com emprego pouco digno, que procuram satisfazer remuneradamente as carências sexuais do sexo contrário. Assevera o Victor que "um número inquantificável de mulheres, na sua maioria solteiras, estão carentes sexualmente". Daí o sucesso dos prostitutos. Confira aqui.

Brasil: Supremo proíbe nepotismo nos três poderes

Na Folhaonline: "O STF (Supremo Tribunal Federal) aprovou nesta quarta-feira a elaboração de uma súmula vinculante que proíbe a contratação de parentes no Judiciário, Executivo e Legislativo da União, Estados, Distrito Federal e municípios." Mas: excepção para os cargos de ministros e secretários do Distrito Federal, estaduais e municipais... E há ainda o complicado problema da "contratação cruzada" (obrigado ao Maximianio por me ter chamado a atenção para o tema).
Observação: imaginem um tema desses a ser debatido no nosso país.

Eneas Comiche

Economista, homem probo, elegante, culto, um dos poucos moçambicanos formados antes da independência nacional em 1975. Já foi ministro das Finanças e governador do Banco de Moçambique. É edil do município de Maputo desde 2003.
Para quem já atravessou várias étapas históricas, conhece a história da cidade de Maputo e é honesto (temos, felizmente, muitas pessoas honestas), sabe que pelo menos cinco coisas aconteceram no reinado de Comiche:
1. A cidade beneficiou e continua a beneficiar de transformações (de fundo, não cosméticas, não do tipo tapa buraco depressa) para melhor, a vários níveis, que nunca aconteceram entre 1975 e 2003.
2. O edil rodeou-se de uma equipa trabalhadora.
3. O edil sempre procurou e procura evitar a gestão urbana patrimonialista, pondo travões aos apetites fundiários.
4. O edil sempre tem procurado a participação dos citadinos. Por exemplo, muitos de nós temos recebido convites para participar nas sessões da Assembleia Municipal e aí emitirmos as nossas opiniões sobre o feito e a fazer. Eu também tenho recebido esses convites.
5. O edil pôs frontal e corajosamente em causa a dupla administração e a diluição dos poderes do município quando teve de fazer face ao novo cargo de governador da cidade.
Creio que não será reeleito, a luta de bastidores é sempre dura e possivelmente alguns não perdoarão a Comiche certas atitudes verticais.
Mas muitos, entre os quais eu, sabem que Comiche foi e é o melhor edil que Maputo já teve. Por isso merece o nosso respeito.
Nota: leia ou recorde uma carta que escrevi a Comiche em Junho do ano passado. E a propósito do tema dessa carta, qualquer pessoa pode ver o trabalho que está a ser realizado na marginal de Maputo.

Musharraf, Nhantumbo e nós

A propósito da recente resignação de Pervez Musharraf do cargo de Presidente do Paquistão, o eng.° Noé Nhantumbo escreveu uma crónica situando-se no nosso país. Convido o leitor a ler aqui.

Mulheres protestaram na Swazilândia contra gastos do rei Mswati III

Na BBC Brasil: "Centenas de mulheres na Suazilândia realizaram uma passeata pelas ruas da capital, Mbabane, para protestar contra os gastos com uma viagem ao exterior para compras feita por nove das 13 esposas do rei Mswati 3º." Obrigado ao Ricardo, meu correspondente em Paris, pelo envio da referência.
Nota: leia ou recorde aqui algo que postei sobre esses gastos. E aproveite ler ou recordar outras coisas aqui e aqui.

Escreverei sobre Eneas Comiche

Nas próximas horas aqui escreverei sobre o edil da Maputo, Eneas Comiche.
Aguardem.

Lázaro Mabunda e os anti-Comiche


O partido Frelimo anuncia hoje os seus candidatos às eleições autárquicas de 19 de Novembro. Em Maputo a escolha será entre Enes Comiche (actual edil), David Simango (ministro da Juventude e Desportos) e Generosa Cossa. Vários jornais têm dado a entender que a escolha deverá recair sobre Simango. Entretanto, o jornalista Lázaro Mabunda reagiu à provável evicção de Comiche e escreveu uma crónica no semanário "O País", da qual reproduzo aqui parte (clique com o lado esquerdo do rato sobre a imagem para a ampliar).
Observação: ó Lázaro, veja lá se não lhe salta em cima um daqueles briosos apostoleiros da graça que amam a escrita açucarada e melíflua, especialmente agora que é tempo forte de campanha (eleições legislativas e presidenciais de 2009 já estão também em marcha) e anda gente múltipla à espera de lugares nos próximos elencos governativos... Então você ainda não sabe que a corrupção não existe, que é mania de doadores e de sua indústria de doamentos?

Chega, Sérgio Vieira! (Graça Machel)


Na imagem, a manchete do semanário "O País" desta semana: uma carta de Graça Machel, viúva de Samora Machel, sequência de uma entrevista dada à STV (e publicada semana passada naquele semanário) pelo ex-ministro da Segurança e coronel na reserva, Sérgio Vieira. Clique com o lado esquerdo do rato sobre a imagem para a ampliar.
Adenda 1: aqui, neste diário, por várias vezes tenho falado de Sérgio e de alguma das suas intervenções públicas. Recorde aqui.
Adenda 2: "Há pouco vimos Sérgio Vieira contar com pormenor como aconteceu a morte de Samora Machel, depois vemos Graça Machel a responder indignada a muitos dos seus pronunciamentos e também lemos a versão de António Cabrita, sem contar com os boatos que nos dão outras versões. Afinal, com quem está a verdade?" (jornalista Olívia Massango na sua coluna semanal com o título "Ser pobre é opção?", mesma edição, p. 8; infelizmente não é possível consultar a versão online do jornal dado estar em manutenção).

21 agosto 2008

Ajuda externa e lealdade do povo

Em epígrafe, o título do editorial do semanário "Savana" desta semana. Confira o trabalho aqui.

A "hora do fecho" do "Savana"

Na última página do semanário "Savana" existe sempre uma coluna de saudável ironia que se chama "Na hora do fecho". Naturalmente que é necessário conhecer um pouco a alma da vida local para se saber que situações e pessoas são descritas. Deliciem-se com a "hora do fecho" desta semana, aqui.

Nkomo: mau espírito do GUN no Zimbabwe (4) (fim)


E vou terminar a série.
Afastado Nkomo (à direita na foto), destruída a ZAPU, Mugabe e ZANU-PF ficaram soberanos no terreiro.
As eleições deste ano revelaram, porém, uma coisa: o povo do Zimbabwe deseja que sejam Tsvangirai e MDC a governar, coisa insuportável para Mugabe (à esquerda na foto) e ZANU-PF, que se consideram donos definitivos do país e atribuem à oposição a natureza maligna de um epifenómeno do Ocidente imperialista.
Contudo, o desejo popular de mudança foi tão flagrante, tão evidente era e é a violência política contra a oposição, tão claras foram as ilegalidades cometidas na segunda volta das presidenciais (nas quais Tsvangirai não participou) e tão péssimo é o estado social do país, que surgiu finalmente a ideia de um "governo de unidade nacional", à moda do Quénia. Começou o processo negocial, durou semanas, mas terminou sem qualquer resultado concreto. Et pour cause.
Entretanto, quando já era evidente que as negociações não dariam resultados concretos, veio à luz uma segunda ideia, a de se pôr o parlamento zimbabweano a funcionar, ideia vinda do mediador negocial, Thabo Mbeki, presidente da África do Sul. O parlamento iria resolver o que as negociações não puderam resolver. Como ZANU e Mugabe tudo têm feito para aliciar a ala minoritária do MDC de Mutambara (este últimos são muito gulosos e, por isso, facilmente manobráveis), o quadro ficaria claro: os primeiros receberiam o apoio dos segundos, ficando o MDC de Tsvangirai em desvantagem parlamentar. Estando em desvantagem, o chamado "governo de unidade nacional" receberia do parlamento a chancela para a distribuição de algumas pastas cosméticas pelas duas alas do MDC (colocadas perversamente em situação de igualdade) e de algum papel subalterno para Tsvangirai, continuando na gestão zanuísta as forças de defesa e segurança, as minas, os negócios estrangeiros, o Banco Central e as empresas estatais. Por outras palavras: tudo ficaria como antes, salvo algum retoque na superfície do bolo. O efeito Nkomo estaria, uma vez mais, activo.
O problema é que Tsvangirai e o MDC maioritário não alinham nesse diapasão. Conhecem bem o efeito Nkomo, conhecem bem os efeitos da perseguição e das prisões e por isso não aceitam "partilhas" à luz desse efeito.
E assim estamos neste interim. Nada irá avançar se, entre várias alternativas, os governos regionais e internacionais não pressionarem firmemente ZANU e Mugabe, se o povo do Zimbabwe não tomar partido mais efectivo. Poder não se dá nem se partilha por geração expontânea: conquista-se. O problema político central no Zimbabwe consiste em saber como se pode lutar democraticamente contra uma autocracia bem armada.
Sugestão: leia ou recorde a minha série com o título "As mãos africanas de Pilatos".

Manchete do semanário "Savana" desta semana


Leia o texto completo aqui.